Os dois homens que tentaram jogar ovos no ex-deputado entraram uma hora
antes de a palestra começar e sentaram em posições distantes um do outro.
COIMBRA, PORTUGAL (FOLHAPRESS) - Dois homens tentaram atirar ovos no
ex-deputado federal Jean Wyllys (PSOL-RJ), nesta terça-feira (26), durante uma
palestra dele na Faculdade de Economia da Universidade de Coimbra, em Portugal.
Wyllys falava havia cerca de 20 minutos quando um dos homens, que estava
sentado na parte mais alta do auditório, se levantou e desceu alguns degraus.
A segurança da faculdade, visivelmente reforçada, logo percebeu a
movimentação e fez um cerco ao homem, que tinha um caixa de meia dúzia de ovos.
Ele chegou a arremessar um ovo na direção da mesa onde estava Wyllys, mas
que acabou desviado por um segurança do ex-deputado, que subiu no palco do
auditório e se colocou na frente.
O professor Boaventura Sousa Santos e outros integrantes do Centro de
Estudos Sociais da universidade, responsável pelo evento, estavam na mesma mesa.
Na sequência, um segundo homem também ficou de pé com outra caixa de ovos
e foi imobilizado pelos seguranças. Junto com um terceiro, que apontava para
Wyllys e participava da ação, foram retirados, sob gritos "tira, tira,
tira" e "fascistas não passarão" do público.
Jean Wyllys decidiu em janeiro, conforme antecipou o jornal Folha de
S.Paulo, desistir do cargo de deputado federal para o qual havia sido reeleito.
Ele atribuiu a decisão a ameaças que vinham sofrendo e disse que passaria a
viver no exterior.
Em Portugal, segundo funcionários do auditório onde Wyllys estava, os
homens que tentaram jogar ovos no ex-deputado entraram uma hora antes de a
palestra começar para garantir lugar. Garrafas de água estavam proibidas, mas,
aparentemente, as caixas de ovos nas mochilas não foram identificadas pelos
seguranças.
"Não peçam para tirar. Nunca tive medo dos covardes. Qualquer
fascista covarde que queira se manifestar, em vez de atirar ovos ou tiros, por
favor, vamos aos argumentos. Levantem-se, manifestem-se, falemos", afirmou
Jean Wyllys, logo depois do incidente.
Segundo o ex-deputado, as pessoas que atiraram os ovos "são
compostas por esse ódio que não permite a diversidade". "É um ovo,
mas, se tivesse uma arma, era um tiro. Começa dessa forma e terminam executando
as pessoas nas ruas. Por isso, é importante o repúdio de todas as
instituições", disse.
Durante a palestra, com o tema "Discursos de ódio e fake news da
extrema-direita e seus impactos nos modos de vida de minorias sexuais, étnicas
e religiosas - o caso do Brasil", Jean Wyllys destacou que Bolsonaro
explorou os medos e preconceitos das pessoas para vencer a eleição, o que
também leva aos ataques que tem sofrido.
"As pessoas fazem pelas fake news, mas também pelo monstro que
habita nestas pessoas, que não suportam ver um gay ocupando espaços que, na
visão delas, é reservado aos heterossexuais", destacou.
Segundo ele, sua atuação no Congresso gerava desconforto porque, para
muitas pessoas, "os homossexuais são bons quando estão em espaços sem
poder, quando esticam, alisam e tingem cabelos num salão de beleza, ou quando
são artistas".
Quase um mês após renunciar a seu cargo político e deixar o país sob
ameaças, Jean Wyllys iniciou um giro pelo exterior dando palestras sobre a
situação política nacional. Além de Portugal, o ex-deputado já falou na
Alemanha e diz ter sido convidado a falar na França, Suécia e Canadá.
'MARIELLE VAI DERRUBAR BOLSONARO'
Wyllys voltou a destacar que deixou o Brasil por se sentir ameaçado,
agora reforçando o papel das notícias falsas, tema que pretende estudar durante
sua temporada na Alemanha.
"Sofria agressões diárias durante a atividade parlamentar de pessoas
que acreditavam nas mentiras que recebiam pelo WhatsApp, especialmente
associando minha homossexualidade a pedofilia. Uma vez minha mãe foi agredida
no supermercado por homem que gritava que ela era a mãe de um pedófilo",
descreveu.
"O sistema decidiu que precisava me eliminar. Se não pela destruição
da minha reputação, da minha imagem pública, através da morte real, com um
assassinato encomendado", de acordo com ele, como ocorreu com a vereadora
Marielle Franco (PSOL).
O ex-deputado fez duras críticas ao atual governo Jair Bolsonaro, que,
para ele, é formado por "incompetentes e mentirosos" e que será
derrubado pelas investigações do assassinato de Marielle.
"A Marielle é que vai derrubar esta canalha. Será a memória dela e
será a revelação de que há relações profundas entre quem hoje ocupa a
Presidência [do Brasil] e o assassinato dessa mulher que tinha muito para dar à
humanidade", disse.
MANIFESTAÇÕES
O auditório, com capacidade para 200 pessoas, estava lotado e cerca de
100 pessoas ficaram do lado de fora por falta de espaço. Jean Wyllys foi
interrompido por aplausos diversas vezes. Na rua principal da faculdade
aconteceram manifestações contra e a favor da presença do ex-deputado em
Portugal.
O PNR (Partido Nacional Renovador), legenda de extrema-direita
portuguesa, reuniu cerca de 12 pessoas para criticar Wyllys, o marxismo
cultural e a esquerda. Do outro lado da calçada, cerca de 200 saíram em defesa,
com palavras de ordem contra o fascismo, entre partidos de esquerda do país e
estudantes brasileiros. A Universidade de Coimbra é a que mais conta com
estudantes brasileiros no país.
Após a palestra, a reportagem verificou que os dois homens que tentaram
atirar ovos em Jean Wyllys confraternizavam com o grupo do PNR.
Nesta quarta-feira (27), Jean Wyllys fará palestra em Lisboa e também
encontrará deputados portugueses na Assembleia da República.
Por Ricardo Ribeiro-FolhaPress